A amargura do português Guterres, secretário-geral da ONU, na muito masculina Assembleia Geral

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UN Secretary General Antonio Guterres delivers a speech, via video call, during the opening session of the peace talks. Source: Getty Images

Depois da fala de 48 líderes internacionais homens, a primeira mulher, presidente da Eslováquia, falou. Um sinal dos tempos difíceis que vivemos, refletidos também na fala do secretário-geral


Em 8 de março deste ano, estava a pandemia a galopar no Dia Internacional da Mulher. Antonio Guterres, como secretário geral da ONU, ao mesmo tempo que declarava estarmos perante uma ameaça sanitária sem precedente

e apelava à mobilização dos estados para a cooperação contra este inimigo comum – o vírus e tudo o que ele implica. Ao mesmo tempo, Guterres, lembrando que o que o que o envolveu na política, no Portugal ainda em ditadura (antes de 1974), foi a revolta contra a forma injusta e desigual como a mulher era tratada. 

Denunciava a distorção persistente, a continuação de séculos de misoginia, traduzida na exclusão das mulheres, por exemplo, de funções de topo nos governos e nos conselhos de administração.

Lembrou então o secretário geral da ONU que a representação política é a prova mais flagrante do desequilíbrio nas relações (de força e influência) entre os géneros.

Em Nova York, decorre desde ontem e por toda esta semana um acontecimento que é ritual – anual – mundial: a Assembleia geral da Organização das Nações Unidas.

É o momento em que chefes de estado ou de governo expõem as suas posições sobre o relacionamento internacional e o estado do mundo.

Ontem, primeiro dia, ouviu-se o discurso de 32 presidentes, reis ou chefes de governo.

Hoje, só ao fim de mais 16 discursos, vai aparecer o primeiro proferido por uma mulher, Suzana Caputova, a presidente da república da Eslováquia. Fala após falarem 48 homens que lideram. Só então vai finalmente ser ouvida a voz de uma mulher eleita para o mais alto posto de poder institucional e diplomático em Bratislava.

Suzana Caputova, 46 anos, uma advogada progressista, ambientalista e anti-corrupção, defensora dos direitos humanos e de género.

Vale ter em conta o cenário catalizador da eleição presidencial de Susana Caputova.

Em fevereiro de há 2 anos, foi assassinado Jan Kuçiak, um jornalista que investigava as ligações entre a máfia e o governo eslovaco de então. O assassino confessou o crime e acusou um dos homens de negócios mais ricos e influentes no país de ter sido o mandante do crime.

Este julgamento transformou os rumores em provas: como aquele governo de então tratava com homens de negócios corruptos A sucessão de manifestações fez cair a classe politica no poder em Bratislava…

Uma das vozes mais protagonistas nesse protesto foi a de Susana Caputova. Candidatou-se à presidência e foi eleita, com 58% dos votos, frente ao eslovaco que o anterior governo tinha colocado na vice-presidencia da Comissão Europeia.

Agora, na Assembleia Geral da ONU, Caputova tem de esperar a vez que no alinhamento das Nações Unidas corresponde à Eslováquia: 49º país a intervir.

Não tem a ver com o facto de ser mulher – é o lugar do país – mas esta posição também reflete como é a representação feminina na chefia de Estado e de governo pelo mundo.

Enfim, ao longo desta semana, a assembleia geral da ONU vai ouvir o discurso dos lideres de 75 países. 72 são homens. Mulheres, apenas 3. Para além da eslovaca Caputova, a boliviana Janine Chavez e a suíça Simonetta Sommaruga.

Duas mulheres que têm mostrado ao mundo liderança elogiada, a neo-zelandesa Jacinda Arden, e a alemã Angela Merkel, optaram por neste cenário ficar caladas.

Merkel mandou uma curta mas expressiva mensagem escrita: a ONU só pode ser eficaz como deve se os seus membros souberem unir-se.

Está amarga esta Assembleia Geral dos 75 anos da ONU. Guterres refletiu isso mesmo no discurso de preâmbulo à assembleia geral. Fez este retrato do mundo: cada dia, com esta crise da pandemia, está mais sombrio. Famílias sofrem, sociedades cambaleiam, e os pilares de nosso mundo balanceiam mais em bases que já eram instáveis.

Enfrentamos simultaneamente uma crise de saúde histórica, e a maior calamidade econômica e de perda de empregos desde a Grande Depressão. Também novas ameaças aos direitos humanos.

A COVID-19 está a revelar as fragilidades do mundo. Desigualdades crescentes. Catástrofe climática. divisões sociais ampliadas. Corrupção galopante. Com a pandemia a explorar essas injustiças, a atacar mais os mais vulneráveis ​​e a apagar o progresso de décadas.

Pela primeira vez em 30 anos, a pobreza está a aumentar. Os indicadores de desenvolvimento humano estão a diminuir. Estamos a perder o caminho para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.

Enquanto isso, os esforços de não proliferação nuclear estão a diminuir, e nós estamos a deixar de agir em áreas de perigo emergente, especialmente o ciberespaço.

Assim o retrato amargo do estado do mundo pelo secretário geral da ONU, o português António Guterres.

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