Brumadinho: “Como é que a sirene não tocou e evitou a morte dos meus filhos?” diz Helena

Taliberti Family

Source: Facebook

“A sirene não tocou, como é que pode isso?” questiona Helena Taliberti, mãe de Luiz e Camila, vítimas fatais do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho. Helena falou à SBS em Português, do aeroporto de Belo Horizonte, Minas Gerais, onde se preparava para embarcar de volta para São Paulo, após 15 dias em Brumadinho. Ela disse que estava levando as cinzas dos filhos de volta para casa.


O arquiteto Luiz e sua irmã Camila Taliberti faziam parte de um grupo de cinco pessoas hospedadas na Pousada Nova Estância, perto de Inhotim, que foi arrastada pelo mar de lama causado pelo rompimento da barragem da Vale.

A parceira de Luiz, a curitibana Fernanda Damian, que estava grávida de cinco meses e que vivia com ele em Sydney, ainda não foi encontrada, assim como a madrasta dele Maria de Lurdes Bueno. As duas continuam na lista de desaparecidos da Defesa Civil.

Encontrados até agora os corpos de Luiz, sua irmã Camila e do pai dos dois Adriano Ribeiro.

Helena Taliberti falou à SBS em Português do aeroporto de Belo Horizonte onde se preparava para retornar para casa em São Paulo. “Os pais de Fernanda [Damian, parceira de Luiz] decidiram voltar para casa e nós acompanhamos a decisão deles. Eles foram para Curitiba e nós para São Paulo e ficaremos atentos aos comunicados e ao andamento das buscas.” 
Fernanda Damian, Brumadinho
Fernanda Damian's body has not been found Source: Facebook
De acordo com Helena, o impacto violento do mar de lama arrastou a pousada onde todos estavam hospedados. “A avalanche não seguiu um curso único, então não se sabe aonde as pessoas, os corpos foram parar. Agora as buscas estão sendo feitas em lugares mais distantes.

"Temos esperanças que nos próximos dias eles sejam encontrados.”

“É uma agonia muto grande a gente sair daqui e não saber, não ter notícia nenhuma.  A gente está rezando muito,” disse.

A família deicidiu por cremar os corpos do Luiz e Camila. “Sim, eles foram cremados,” diz Helena, “estamos levando as cinzas conosco. Ainda não sabemos o que faremos, gostaríamos de ter a Fernanda conosco,” completou.  

Luiz Taliberti, arquiteto premiado que vivia com Fernanda em Sydney, . Helena se disse muito feliz com a homenagem feita ao filho pelos colegas australianos.

“Eu vi a homenagem, fiquei muito emocionada. Fiquei muito surpresa, a quantidade de amigos no Brasil e na Austrália. Luiz dizia que o pessoal do escritório com quem ele trabalhava era como a família dele aí na Austrália. Ele gostava de todos no escritório, estava muito bem adaptado. Mas eu fiquei surpresa porque o Luiz por onde passou deixou boas recordações. Ele deixou amor.

“O pessoal do escritório na Austrália fez uma homenagem linda para o Luiz, muito linda. Isso conforta coração de mãe."

Luiz taliberti, Brumadinho
Luiz at a work function in Sydney: "We feel we lost a brother," said workmate Andrei Dolnikov. Source: Supplied
Helena disse que tanto Luiz como Fernanda estavam bem adaptados na Austrália. “Ele tinha paixão pela Austrália. Confesso para você que essa paixão se estendeu à nossa família. Eu fui três vezes para a Austrália, confesso que cada vez que eu fui eu me apaixonei mais.”

“Ele não tinha planos de voltar para o Brasil tão cedo, ele queria que o filho deles nascesse aí na Austrália. A Fernanda também gostava muito da Austrália ela estava muito tranquila em ter o nenê aí.”

Helena e o marido Vagner Diniz têm se pronunciado sobre o rompimento da barragem com frequência, com vários veículos de comunicação na Austrália cobrindo o caso do jovem casal de Sydney, vítimas do rompimento da barragem da Vale, no Brasil.

“Agora não dá mais para ignorar, não dá mais para dizer que foi um desastre natural. Não dá para dizer que foi uma tragédia, a gente sabe que não foi. E não vai acontecer de novo e, não pode acontecer de novo. Dois dias atrás eles evacuaram mais duas comunidades, então tem mais gente desalojada aí, com perigo de desabamento de barragem.

“Minas Gerais é um estado todinho baseado na mineração, o perigo disso acontecer de novo é grande e não pode acontecer de novo. Helena disse que tira suas forças da indignação que sente.

“Acho que o que me move é essa indignação, da sirene não ter tocado e evitado a morte dos meus filhos. A sirene não tocou, como é que pode isso?

Brumadinho Firemen
Source: Corpo de Bombeiros de Minas Gerais/ Divulgação
“Eles sabiam que a barragem estava com problema. Uma reportagem da Andréia Said, do website do G1, mostrou os emails trocados pela diretoria da Vale, eles sabiam que a barragem estava com problema, estava vazando, dois dias antes.  

“Eles sabiam, e não fizeram nada."

Apesar das buscas incessantes, da luta para colocar os nomes de seus familiares na lista dos desaparecidos da Vale (a empresa inicialmente não incluiu nomes de pessoas que não fossem funcionários), Helena disse que encontrou muita gente boa e generosa nessas 15 dias que passou em Brumadinho.

“Eu tive um apoio de um guia de Inhotim, chamado Junior. Ele me ajudou em tudo, ficou o tempo todo ajudando a nossa família, onde a gente precisava. Ele foi uma pessoa maravilhosa, como ele, tinham muitos.

“Voluntários que iam para lugares mais distantes levar comida e água para os bombeiros. Vimos voluntários que foram lavar as roupas dos bombeiros, e que lavavam os bombeiros, isso me impressionou muito,” completou.
Brumadinho fireman
Source: Corpo de Bombeiros de Minas Gerais/ Divulgação
“Agora que a vida vai tomar um rumo, vamos ver o que vai acontecer, eu vou chegar em São Paulo, o Luiz estava hospedado lá em casa, as coisas dele estão lá. Eu vou ter que ir na casa da Camila. Não sei como as coisas vão ser. Mas espero sim que tudo fique bem,” disse.

“Vamos celebrar a vida de Luiz e Camila, e o legado que eles deixaram,” completou.

Até agora o colapso da represa da Vale já matou 165 pessoas, enquanto 158 ainda estão desaparecidas, de acordo com a lista publicada no dia .

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