Psicóloga sobre a Black Friday: “Se vemos algo limitado, temos o sentimento de escassez. Agimos no impulso e fazemos 'compras emocionais' do que não precisamos"

Patricia Martins

Psychologist Patricia Martins is experienced in working with adults and young people who are questioning their gender identity or who are transitioning Source: Supplied

A psicóloga brasileira Patricia Martins, que mora e atua em Melbourne, explica como grandes promoções como a Black Friday podem ser uma armadilha emocional e financeira, e dá dicas de como aproveitar esse tipo de oferta de forma saudável. "Faça uma lista do que realmente quer ou precisa, e consulte antes os produtos no site da empresa, para ter certeza sobre a compra".


Novembro é um mês de grandes promoções em lojas e empresas que oferecem os mais variados produtos e serviços. A última sexta-feira do mês, chamada de "Black Friday", é quando geralmente se formam longas filas na entrada de todo o tipo de estabelecimento comercial, e algumas dessas filas se formam antes mesmo de esses locais abrirem as portas.

Com o comércio online cada vez mais popular, novembro também é um mês de grande movimentação de compras pela internet. As promoções podem ser aproveitadas de forma saudável, quando compramos algo que realmente precisamos por um valor menor do que o praticado normalmente, mas também podem ser uma armadilha se compramos algo que não precisamos ou que na realidade não poderíamos bancar, e gerar tristeza, frustração e dívidas.

Segundo a psicóloga brasileira Patrícia Martins, que mora e atua profissionalmente em Melbourne, é muito comum as pessoas comprarem por impulso quando há grandes promoções como as da Black Friday. “Quando a gente vê algo que é limitado, dá aquele sentimento de escassez, então o nosso cérebro entende que a gente precisa agir porque senão vai perder aquela oportunidade.”
Quando a gente vê algo que é limitado, dá aquele sentimento de escassez, então o nosso cérebro entende que a gente precisa agir porque senão vai perder aquela oportunidade.
Ela explica que esse tipo de promoção é um gatilho para o FOMO (Fear Of Missing Out), o que gera uma aflição quanto a não poder participar do evento que está acontecendo e comprar aquele produto tão desejado. “Assim a pessoa acaba agindo na impulsividade, fazendo compras emocionais e comprando coisas que não precisa”.

Compra emocional

Patrícia também explica o termo ‘compra emocional’, que é quando a pessoa compra algo para se satisfazer e se sentir bem momentaneamente por ser mais fácil do que explorar o real motivos da angústia ou tristeza e tratar esse problema.

“Quando eu digo ‘compra emocional’ é porque a compra acaba servindo como um placebo. A pessoa tem aquele efeito homeopático por um período de tempo, e depois que o placebo passa, ela entra naquele local de falta de novo, naquele local de angústia”.
A 'compra emocional' é como um placebo. O efeito (de bem estar) dura por um período. Quando passa, a pessoa entra naquele local de falta de novo, naquele local de angústia.
Depois que a felicidade temporária pela compra de um produto acaba, e a pessoa percebe que não precisava ter comprador aquele produto ou que gastou mais do que podia, por exemplo, o sentimento de angústia que já existia antes da compra, pode piorar. “E aí pode acontecer o efeito bola de neve, em que uma frustração vai levando à outra e tudo isso traz uma angústia muito grande para o indivíduo.”

Patrícia diz que nunca se deve fazer compras por impulsividade, e que não se deve deixar levar por esse sentimento de ‘escassez’ que as grandes promoções nos geram. “Porque acaba sendo um gatilho para a ansiedade e a sensação de que não temos controle, de que é tudo ou nada.”

Compra compulsiva

Ela fala que se a pessoa está um pouco triste ou desanimada, compra alguma coisa e o momento da compra se sente feliz, o cérebro começa a entender que a estratégia da pessoas para lidar com a tristeza é sempre comprar alguma coisa.

“Isso pode se tornar algo compulsivo que também pode levar a pessoa ter outros problemas no futuro. Se ela está comprando coisas que não precisa para ‘maquiar’ um sentimento com o qual ela não está conseguindo lidar, ela pode entrar em um ‘loop’ infinito e até em débito, e aí ela não vai mais conseguir preencher aquele vazio com tanta frequência”.
Se você compra coisas que não precisa para ‘maquiar’ um sentimento difícil de lidar, pode entrar em um ‘loop’ infinito e em débito, e não conseguir mais preencher o vazio com frequência.
Patricia diz que mesmo quem não faz compras para amenizar um sentimento ruim, pode ser afetado por períodos de grandes promoções, pois pode ter a mesma sensação de que está perdendo uma grande oportunidade e que pode se frustrar caso depois acredite que perdeu uma chance que era boa.

Como fazer compras conscientes 

Para que essas datas de super ofertas sejam aproveitadas de forma saudável, Patricia sugere que as pessoas façam listas do que estão precisando ou querendo comprar, dias antes de as promoções terem início, e analisem se realmente precisam daquelas coisas.

“Vá no website da empresa, veja o conteúdo oferecido, os aspectos, e veja se você realmente precisa. Para quando você for realizar a compra, você ter a certeza de que está fazendo a coisa certa, para que não gere frustração ou arrependimento. E para que você não fique com aquele sentimento de ficar pensando na coisa que você perdeu.”
Vá no website da empresa, veja o conteúdo oferecido, os aspectos, e se você realmente precisa. Para quando for realizar a compra, você ter a certeza de que está fazendo a coisa certa.
E mesmo fora dos períodos de grandes promoções, Patricia diz que é importante tomar alguns cuidados antes de realizar compras. Ela ressalta a importância de estabelecer metas e objetivos, e a partir daí economizar o que for possível para ter o suficiente para comprar aquilo que deseja em um prazo.

“Por exemplo, se a pessoa tem um desejo de comprar um carro mas todo dia tem a rotina de pegar um café e um muffin na hora de ir para o trabalho, ela está perdendo um pouco do recurso que poderia utilizar para a compra do carro que deseja por causa dessa despesa desnecessária”.  

Patricia destaca que não é necessário que se passe por muitas privações, “mas a pessoa deve ter consciência de onde está gastando seu dinheiro e das escolhas que está fazendo no dia a dia quando vai fazer uma compra”.

E sugere: “toda vez que você for comprar alguma coisa, antes de finalizar a compra, analise se você precisa daquilo. Se você passa em frente a uma loja, vê um vestido e pensa: ‘preciso desse vestido para viver’, se comprar o vestido por impulso corre o risco de nem usá-lo. Entre, experimente, e espere. Se dias depois você ainda estiver se lembrando e desejando aquele vestido, essa pode ser uma compra interessante de ser feita”. 


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